sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Se Eu Fosse Você 2*



Gargalhada amarela

Se Eu Fosse Você 2 (idem, Brasil, 2009), de Daniel Filho, já bateu a maioria dos recordes de bilheteria no Brasil, deve bater mais alguns enquanto escrevo, e mais outros enquanto vocês lêem. Ou seja, ele como franquia e produto de sua idealizadora-mor (Globo Filmes) é teoricamente um modelo para uma “indústria de cinema”. A questão é até que ponto isso é bom ou ruim? Essa é uma pergunta que merece centenas de debates, dezenas de ensaios e uma meia-dúzia de livros, além de alguns filmes – no mínimo. Mas vou aqui rabiscar algumas coisas sobre o assunto.

O $uce$$o do filme parece fazer com que a maior parte dos filmes brasileiros do “grande público” se resumam a mundos maravilhosamente isolados. Os filmes ou são de sertão, ou são de favela ou são do maravilhoso mundo do Projac. Nesse último, o Rio de Janeiro continua lindo, só que sem absolutamente nada além das classes A e B plastificadas, num planeta onde nem pontas de cigarro sujam o ambiente – aqui, fumar é um crime hediondo.

Lógico que existem felizes (e infelizes) exceções, que misturam mundos, do mesmo jeito que há pérolas hiper bem-feitas desses mundos bem particulares – assim como temos filmes como o Carreiras (2006), do Domingos Oliveira, pra falar num recente ainda fresco em minha memória e que não se encaixa em nenhum dos casos. Mas, por outro lado, também existem coisas que seguem as regras de uma das partes desse trinômio e não funcionam muito além disso: e é justamente o caso de Se Eu Fosse Você 2.

Começamos com a esperada explicação tola, mas compreensível e coerente com o filme. Quando Tony Ramos e Glória Pires pensam em se separar, temos um conflito gerado pelos Beatles, que, num telefonema subseqüente, resulta numa ótima gag, que parece tirada de um filme de Woody Allen – trocando o jazz pelos meninos de Liverpool. O problema é que, fora essa sacada, me esforcei pra lembrar, mas nenhuma outra ficou.

As piadas e situações com o sexo oposto são na maioria das vezes óbvias e baseadas em frases feitas (talvez rimos por um “inteligente” ritmo rápido que impede qualquer reflexão sobre a elaboração/interpretação do texto), o machismo está lá firme e forte (homem = futebol, grossura, trabalho; mulher = compras, delicadeza, casa), assim como tudo ligado ao conservadorismo e a uma comédia chula. Ouvimos que “criança que faz criança não é mais criança” e vemos que “homem que dança é gay”.

Por outro lado, Daniel Filho induz (sem empurrar) ao riso mais do que no primeiro filme. A câmera parece gritar menos, as situações fluem com mais naturalidade e, consequentemente, com um pouco mais de humor. Exceção feita a uma cena (quando a briga fica feia e parece parte de um outro filme), o constrangimento é filmado de uma maneira que ele geralmente fica do lado de lá e o riso vem pra cá sozinho.

Esse riso de Se Eu Fosse Você 2 às vezes chega ao nível de uma gargalhada, e isso é sempre bom. Diferente do amarelo e o medo de uma falta de diversidade que vêm junto com ela.

Filme: Se Eu Fosse Você 2 (idem, BRA, 2008)
Direção: Daniel Filho
Elenco: Tony Ramos, Glória Pires, Isabelle Drummond, Chico Anysio, Maria Luisa Mendonça.

8mm
Cafonice quase irresistível
Uma coisa cafona, cheia de gente que não sabe até que ponto eles e o evento devem ser levados a sério, mas que mesmo assim não dá pra não assistir: o Oscar. Depois de um 2008 surpreendentemente recheado de gente boa, esse ano o ôba-ôba maior, pra o pessoal da Academia, é em cima de O Curioso Caso de Benjamin Button (13 indicações), de David Fincher (Clube da Luta, Seven, Zodíaco).
Não sou do fã-clube do cara (que tem uns membros bem chatinhos), mas ele tem dado menos importância aos seus malabarismos, a ponto de ter feito um Zodíaco da vida: um filme com atores, roteiro e direção no mesmo tom, e que conseguem sustentar durante duas horas e meia uma nota bem alta. Não li coisa tão boa da nova parceria dele com Brad Pitt, mas...

Além...
Dos outros mais comentados, vi o Batman – O Cavaleiro das Trevas, e dá pra dizer que Heath Ledger, lá do além, merece o Oscar que vai ganhar; e que James Dean vai ficar com uma pontinha de inveja – mesmo que o Rebelde Sem Causa não deva nada a Ledger ou a nenhum outro ator entre nós. Vi ainda a coisa sensacional que é Wall-E, defendido por muita gente boa como a melhor coisa que saiu de Hollywood em 2008. Como minha Hollywood se resumiu a bem pouca coisa esse ano, concordo.
De resto, não vi e já gostei do Vicky Cristina Barcelona, de Woody Allen, e do Milk (ainda sem tradução), de Gus Van Sant. O Lutador, de Darren Aronofsky (Réquiem para um Sonho, A Fonte da Vida), deve valer no mínimo pela atuação de Mickey Rourke e pela trilha sempre ótima de Clint Mansell. E quero ver também A Troca, de Clint Eastwood, que depois de já ter feito algumas obras-primas, lança dois filmes em menos de 12 meses e já aparece na pré-produção de outro. Completamente ativo aos 78 anos. Alguém encomende cinco estátuas, por favor.

Vistos e/ou revistos durante a semana:
* Trainspotting (1995), de Danny Boyle
* Entrevista com o Vampiro (1994), de Neil Jordan
* A Igualdade é Branca (1994), de Krzysztof Kieslowski
* A Liberdade é Azul (1993), de Krzysztof Kieslowski
* Se Eu Fosse Você (2006), de Daniel Filho
* Amores Brutos (2000), de Alejandro González Iñárritu
* Menino do Rio (1982), de Antonio Calmon
* Contos Proibidos do Marquês de Sade (2001), de Phillip Kaufman
* Se Eu Fosse Você 2 (2009), de Daniel Filho (cinema)
* A Fraternidade é Vermelha (1994), de Krzysztof Kieslowski
* A Professora de Piano (2001), de Michael Haneke

Imagens em: www.seeufossevoce.com.br/ e http://adisney.go.com/disneyvideos/animatedfilms/wall-e/flash_site.html

* Coluna 70mm originalmente publicada no jornal semanário O Trombone – Itabuna-BA.

3 comentários:

um báu disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
um báu disse...

hauhuahuahua... boa teoria!Realmente tem fundamento toda essa coisa da influência do "péssimo" ambiente em que me encontro!rs... já ensaiei sentar aqui pra escrever mas na maioria das vezes o cansaço de um dia pós praia me impede!hehehe...porémmm seu comentário me estimulou bastante, veremos se nessa madrugada sai algo qualquer... estou tão pobre filmicamente falando, que terei que escrever algo sobre o "tchuco gostoso" e o verão brasileiro!rs...
Ainda não assisti Se eu fosse você 2. Apesar de não ter sido um filme que ganhou espaço na minha listinha de favoritos nacionais, lembro que dei boas risadas no 1. Algumas piadinhas de senso comum quanto ao sexo oposto que poderiam ter caído no banal, fugiram da previsibilidade e ganharam nova roupagem graças a atuação dos protagonistas. Acho Tony Ramos um monstro da dramaturgia brasileira. =]
bjo bjo bjo!!!!!!

Leandro Afonso Guimarães disse...

haha...
eu ia usar exatamente o termo "tony ramos é um monstro", mas achei que ia soar entusiasta demais - talvez mais do que sou, embora goste mesmo dele. :)

acho que a gente precisava de 'se eu fosse você's' da vida, mas só um pouquinho.

tipo, aquela coisa: doses obrigatórias, mas obrigatoriamente homeopáticas, por favor.