terça-feira, 29 de abril de 2008

Redundância

Entre Barcelona e Nova York

Dia desses fui reler os capítulos de Scorsese e de Woody Allen no livro Grandes Diretores de Cinema. Nele, Marty diz que o principal erro a ser evitado por um cineasta é o da redundância.

Pois bem. Alguns dias depois vejo Barcelona (idem, EUA, 1994), de Whit Stilmann, cuja narração em off chama o espectador de cego sempre que possível. O filme também tem outros defeitos e alguns méritos, mas isso não vem ao caso.

O assunto aqui é voice-over e redundância – por mais que Marty não tenha falado exatamente de off naquele ponto do livro. Lembro de Scorsese e imediatamente de Bons Companheiros justamente por achar aquilo uma aula (mas não só) de off. Taxi Driver e especialmente Laranja Mecânica são outros dois (exemplos óbvios) que me vêm à mente como coisas irretocáveis nesses e em quase todos os outros pontos.

Lembro também de Medo e Delírio em Las Vegas (preciso rever), com narração excessivamente descritiva e literária, mas ao mesmo tempo importante pra tudo aquilo. E de Dogville, que oscila entre um off (e um filme) perfeito e um ou outro momento que incomoda. Sim, eu adoro Dogville, apesar de não achá-lo uma obra extra-terrena, mas isso também não vem ao caso.

The point is: quero off's decentes!

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Juno



Vitória da endorfina

Resisti à oferta de Divx's da vida e enfim vi no cinema (onde qualquer filme deve ser visto – pelo menos pela primeira vez) Juno (Juno, EUA/ Canadá, 2007), de Jason Reitman, essa coisa super-cultuada como filme-fofinho-original-independente-bem-escrito-e-dirigido. O resultado é realmente legal, tem seus momentos, mas no fundo e no fim não tem tanta originalidade quanto parecia (ou diziam) ter.

A história gira em torno de Juno (Ellen Page), que engravida de seu melhor amigo. A construção dessa relação, por mais irrelevante que pudesse ser, é fraca. Somente uma cena demonstra um grau de intimidade muito acima da média. Ainda assim, a relação entre “melhores amigos que transaram uma vez”, poderia ser simplesmente uma relação de “conhecidos que transaram uma vez”.

É estranho também alguém ser tão tímido, passar uma idéia quase assexuada – reconhecida pela própria família de Juno –, e ainda assim conseguir ser o melhor amigo de uma menina doidinha-punk-fã-de-cinema-gore. Esse alguém, aliás, é o tímido-nerd-assexuado-engraçado-bobão, que parece ter sido clonado de Superbad (2007) para cá. Michael Cera (aqui no personagem de Paulie Bleeker), bom nos dois papéis, corre o risco de virar o ator de espelho, com apenas pseudônimos para se interpretar – o que espero não acontecer, porque o garoto parece ter potencial. De qualquer jeito, ele funciona para dar aos outros personagens e ao público um caráter divertido, engraçadinho e constrangedor – bem-vindo quando o constrangido não é você.

Pensando nessas coisas, e em outros tantos momentos do filme, fico com a impressão de que Jason Reitman e nossa queridíssima Diablo Cody, a ex-stripper roteirista do filme, estavam muito mais preocupados em fazer um filme acessível a todo mundo e engraçado do que realmente em construírem personagens convincentes – mais bem vindos e necessários aqui do que em Superbad, por exemplo. Exceção feita a Juno, os outros são tratados na maioria das vezes com a profundidade de uma bandeja de garçom – e isso não me parece legal pela idéia do filme e do tratamento dado a Juno.

Outro momento que ilustra bem essa questão é quando Juno vai falar aos pais que está grávida. Sua melhor amiga está presente e dando pitacos (óbvia e previsivelmente engraçadinhos), e a reação dos pais é surreal, mas naturalmente divertida. A reação soa fake de uma maneira incoerente com a postura do tratamento dado a Juno. Outro ponto é o até interessante casal que aparece na história: Mark (Jason Bateman) quase tão bem construído como Juno, apesar de insosso demais, e Vanessa, que se mostra expressiva em uma aqui boa Jennifer Garner, mas que pouco faz além de funcionar como uma figura decorativa em um ou outro momento engraçado. Novamente, tem-se a impressão de que o “fazer rir” é 468 mais importante que um conteúdo.

Mas Juno, o filme, não é uma bomba e tem seus momentos e méritos pessoais. Primeiro, vale dizer que Juno, a personagem, não é explicitamente julgada nem tida como uma heroína. Ela é um adolescente de 16 anos que fez uma besteira, como gente mais velha e supostamente mais madura faz. E é mostrada assim. A atuação de Ellen Page também é ótima, e só não é perfeita porque ela oscila entre o real convincente (maior parte) e o caricato-engraçadinho.

Os defeitos do filme são parcialmente encobertos pelos pontos positivos, uns esperados e outros imprevisíveis em produções do gênero (?!). A incessante vontade de te fazer rir às vezes funciona, e o tema escolhido, bem como o tratamento dado à personagem principal, são válidos e fogem bem pouco da regra.

O que não foge, no entanto, é o fim, excessivamente fofinho, assim como as atitudes que levam a esse término, pouco convincentes – talvez se eu realmente tivesse 16 anos aceitasse aquilo, mas apenas talvez. Por outro lado, a cena final tem lá seu quê de original e marcante, mais até do que famigerada trilha que marca todo o filme, bonita e válida, mas que beira a irritação pelo exagero.

Terminada a sessão, fiquei com a impressão de que Diablo Cody (talvez talentosa mas aparentemente não genial) imaginava que não tinha como esse roteiro, com um diretor minimamente competente, não ser pelo menos sucesso de bilheteria entre os adolescentes. É no fundo uma coisa com um fundo sério que se perde e que serve pelo menos para se dar risada, o que universalmente faz bem, do cinéfilo mais ranzinza ao imbecil mais risonho. É pouco, pode não ser suficiente, mas até que funciona como um bom passatempo, que entretém mais do que ofende. Isso é válido.

Visto no cinema no dia 9 de abril