domingo, 27 de julho de 2008

Era uma vez...



Mais uma vez...

A sessão de Era Uma Vez... (BRA, 2008) no Semcine, em Salvador, fez eu me sentir um imbecil em Cannes, hiperbolizando o acontecimento. Antes da projeção, os principais atores do filme subiram ao palco da imponente sala principal do Teatro Castro Alves acompanhados do diretor Breno Silveira, que quase recita uma poesia para interpretar o filme por todos nós. No final, uma platéia ensandecida aplaudiu a coisa, alguns em pé, fazendo eu acreditar estar numa projeção de um vencedor da Palma de Ouro.

A história é simples: ele (Dé, interpretado por Thiago Martins) é um trabalhador honesto, um "exemplo" de pessoa, que faz tudo por todo mundo e não usa drogas, mesmo que toda a sua trupe o faça: ele é o clássico-bonzinho-com-cara-de-coitado-sem-dinheiro por quem deve se fazer tudo no roteiro para que o rapaz ganhe a empatia de todo mundo. Já ela (Nina, interpretada por Vitória Frate) é a menina linda e igualmente boazinha, só que entupida de dinheiro e de carência, uma vez que o mundo que ela vive é obviamente fútil, e ela é muito mais que isso. Para completar, temos ainda a favela e a praia cariocas prontas para exportação, explicitada através do imponente símbolo da Columbia na abertura do filme.

Antes da projeção, Breno Silveira falou que não importava se uma história ou um tema eram simples ou batidos, mas o importante era como isso seria contado. Nada mais óbvio. O problema é que a história dele, escrita por Patrícia Andrade – a mesma dupla de Dois Filhos de Francisco (2005) –, não tem nada de muito de genuíno. Como ele explicou (argh!) antes da sessão, o filme tenta levar você às risadas e às lágrimas em altas proporções e a todo momento: praticamente uma novela.

Temos basicamente uma clássica história de amor, com toques de Cidade de Deus (2002) e de Tropa de Elite (2007) – é verdade. E se nesse último a questão sócio-político-econômica já poderia ser considerada fascista, no caso de Era uma vez... a irresponsabilidade atinge um grau ainda maior, apesar de menos presente – o que não abona a maneira rasa e banal como a relação tráfico-favela-zona nobre é tratada aqui.

Mas, no fundo e no final, o filme é uma história de amor, que ironicamente, para chegar à sua resolução catártica, acaba precedido por uma seqüência de provas de burrice e de falta de amor. É verdade que inteligência e amor dificilmente caminham lado a lado, mas as armadilhas provocadas pelo roteiro, mesmo que resultem num até esperado melodrama, são tão ilógicas que fazem você se perguntar onde está tanto amor.

Ainda assim, vale dizer que Era Uma Vez... é tecnicamente bem feito e relativamente bem atuado, especialmente os personagens periféricos. Como um todo, os personagens principais ainda oscilam um pouco, mas se sobressaem em meio a todo o filme.

ssas atuações e uma boa intenção de falar de amor, contudo, não salvam Era uma vez..., que mesmo assim deve ser um sucesso estrondoso de bilheteria. Plagiando um amigo, Era uma vez... poderia se chamar Mais uma vez...

Visto no dia 22 de julho no Teatro Castro Alves – Salvador.

terça-feira, 15 de julho de 2008

Wall-E



Não só o filho dos pais

A dignidade voltou. Pelo menos no que diz respeito ao fato de um filme bom ser citado aqui. E em dose dupla. O texto que vou abortar aqui (pressa pra terminar de editar o vídeo ali) é escrito depois de duas sessões de Wall-E (idem, EUA, 2008). E no cinema!

A sinopse é a seguinte: lá pelos idos de 2700, já com a certeza de nenhum de nós por aqui, um simpático robozinho vagueia solitário por um planeta Terra decrepto. Esse robozinho boa praça, cuja única companhia é uma baratinha não menos legal, chama-se Wall-E – “Waste Allocation Load Lifter - class Earth”, ou “empilhadeira de carga para distribuição de lixo - classe Terra”.

A idéia de um ser não humano em nosso planeta já foi explorada por nada menos que E.T (1982), de Spielberg, um daqueles filmes que até os que odeiam cinema provavelmente já viram. E o maior exemplo de ficção científica futurística-espacial remete a 1968, com Kubrick, autor daquilo que dizem ser um filme, mas que eu mesmo não sei o que é: 2001 - Uma Odisséia no Espaço. 2001, aliás, que 40 anos depois vê um filho seu com E.T. ter características descaradamente sugadas dos pais, mas ainda assim com vida própria.

Não só a idéia de um ser solitário na terra se parece com o filme de Spielberg, como também a forma como este ser vai se humanizando, se relacionando e conquistando a empatia da gente. De 2001, temos Hall na versão 2008 (ou 2700, que seja), desde o visual à idéia de construção e desenvolvimento do computador como personagem (!). E temos ainda a trilha – que eu me lembre, são duas músicas do filme de Godstan.

Curioso também que Wall-E, no fim das contas, não é um filme infantil, mesmo que tenha nas crianças boa fatia do público. Crianças, aliás, que não devem agüentar o imenso (e lindo) período sem diálogos, assim como muita coisa que definitivamente não vejo entrando na cabeça de gente que ainda está no primário. Posso estar subestimando as crianças, ou estar me achando uma mistura de Godard com Einstein, mas pra mim Wall-E consegue ser muita coisa ao mesmo tempo – e pouca coisa infantil.

É, até porque precisa ser, um filme com um toque de humor inocente, infantil. É também uma visão pessimista, conformista, alienada das coisas e do futuro (já presente), ao mesmo tempo que consegue ser uma poesia visual onírica, que mescla referências explícitas com imagens pessoais. Para completar, é ainda uma história de amor entre robôs. E de heróis – porque o filme é norte-americano do início ao fim, passando pela auto-crítica (?).

Wall-E é podre de fofinho e carregado com muito de reciclagem, de homenagem e de "pré-conceitos". Mas ainda assim, é um filme que funciona por si próprio. E muito bem.

Visto no dia 27 de junho e revisto em 13 de julho – nas duas vezes no cinema

Ps: Obrigado, Pixar. Como se não bastasse manter o nível das animações lá no espaço (aqui literalmente), o tradicional curta de antes do filme é sensacional.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Melhor amigo da noiva, O



Um bom filme ruim

Prólogo envergonhado: Quando eu decidi criar um blog, jamais imaginei fazer o que vou fazer. Mas, sabe como é, quando as teias de aranha tomam conta de alguma coisa, o desespero bate e o responsável por essa coisa perde a racionalidade. Não se acostumem, mas vai lá: texto sobre MOH.

Sim, vi O Melhor Amigo da Noiva (Made of Honor, EUA/Reino Unido, 2008), outro enlatado cômico-constrangedor-romântico pra a coleção de multiplexes. E, veja só que coisa, o filme é carregado com todas as espécies de clichês e de regras, do roteiro Syd Fieldiano ao final, e até que funciona como uma coisa divertida.

Os estereótipos devidamente caricatos (!) estão lá: 1) o garanhão (aqui de meia-idade, não o de American Pie) que não come duas vezes a mesma mulher (Patrick Dempsey); 2) a mulher perfeita mas encalhada e que vai ficar com ele (Michelle Monaghan); 3) o imbecil que quer ser esportista mas que é completamente loser e está ali somente para fazer os outros rirem do constrangimento alheio (acho que Kevin Sussman, fuçando no IMDB); 4) e mais o rival a ser batido, aqui Kevin McKidd, o Tommy de Trainspotting.

Cada respiração, cada tipo de relacionamento, cada idéia da tela, parece ser possível somente em outro mundo. Ou em Hollywood – o que dá no mesmo. À primeira vista, isso obviamente não é legal, mas o filme mantém a sua coerência, e isso é sempre bom.

De coisas legais, podemos falar da referência válida a Kill Bill (que já pode ter sido referência a outra coisa que não conheço), depois com Oasis e sua Stop Crying Your Heart Out. E do final que oscila entre uma coisa novela das oito e A primeira noite de um homem – isso não é spoiler, mas sim podre de previsível. Paul Weiland pode até ser mais um diretor de aluguel, mas pelo menos bom gosto o cara deve ter.

Anyway, MOH é mais um desses enlatados, isso é verdade, mas até que diverte – e cada cena, cada fala, cada peido aqui é feito pra isso.

Como reflexão exata do filme, vale dizer que não faltaram imbecis para bater palma em cena er... “vitoriosa”, mas esse filme é feito pra eles. E pra quem precisa atualizar o blog.
Visto no cinema no dia 26 de junho

Ps: O filme é o último em que Sydney Pollack atua. Pode não ser fim ideal, mas merece crédito. RIP, Sydney.

Ps2: Wall-e e Blow Out fizeram eu ter certeza (como se precisasse) que MOH realmente não é um filme bom.