terça-feira, 27 de março de 2012

Sentimentos por imagens*














(Com spoilers.)

Shame (Shame – Reino Unido, 2011), de Steve Mcqueen, não fala só de um homem viciado em sexo, mas do que parte de ser humano tem de mais primitivo, e quando vemos e ouvimos diálogo que remete a Neandertal, analogia é inevitável. Não só no caso do personagem principal (o sensacional Michael Fassbender como Brandon), mas no caso de sua irmã (Sissy, a não menos ótima Carey Mulligan).

Mesmo seus momentos de descargas “orgásticas” remetem a muita coisa antes de alegria e prazer. Apesar do vício ser dele, ambos parecem frustrados em meio à impotência de se sentirem bem onde estão. São recheados de momentos infelizes, com ou sem dinheiro, com ou sem orgasmo, com ou sem casa, com ou sem justificativa, pouco importa; McQueen não quer explicar, quer mostrar.

Próximo ao fim do filme, quando ela, debilitada, se dirige a ele com um simples palavrão, ele poderia fazer o mesmo para ela; aliás, ele fez basicamente o mesmo em momentos anteriores. Logo depois, na última sequência do filme, voltamos a local onde ele esteve no começo, em situação semelhante. O que personagem vai fazer? Pode repetir atitude inicial, baseado em crítica à irmã pode se provar um hipócrita; como também pode se sentir “curado”, pode “se redimir”.

No entanto, não sabemos. Seria mais fácil criar uma torcida com um jogo de causa e consequência, ou com alguma vingança, mas não é o que parece interessar a Mcqueen. Com isso, vemos lágrimas que dificilmente chegam na plateia, vemos imagens que são mais fortes e duradouras que o sentimento que elas passam.

Por outro lado, se não dá para dizer que senti a dor daqueles personagens, não posso dizer que me senti indiferente ao que foi projetado. Excesso à parte, imagens marcam e criam um mundo próprio. Isso nunca é ruim.

* Coluna originalmente publicada aqui.

2 comentários:

ANTONIO NAHUD disse...

Um excelente filme com dois dos melhores atores de hoje.
Grande abraço,

O Falcão Maltês

Rafael Carvalho disse...

Pra mim, esse filme só tá perdendo este ano para A Separação e O Artista. Como disse, é doentio e humano ao mesmo tempo, e essa coisa do McQueen mais sugerir do que responder é incrível, porque não há respostas, mas a tristeza está lá estampada, a desilusão que parece ser fruto de um passado problemático ronda os personagens há todo momento. Filmão, hein.