quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A paixão pela arma*

Caminho para o Nada (Road to Nowhere – EUA, 2010) foi o primeiro filme que vi de Monte Hellman. Impossibilidade de paralelo com carreira à parte, lembranças imediatas tendem a ser 8 ½ (1963) de Fellini, O Desprezo (1963) de Godard, Abraços Partidos (2009) de Almodóvar e, talvez a maior, Cidade dos Sonhos (2001) de Lynch.

Não que Hellman soe aqui um emulador de Lynch, cuja carreira começou quase duas décadas depois. O que ele faz – como Lynch – é mergulhar em mundo cinéfilo menos romântico e mais sombrio, que envolve mecenas e membros da equipe com passado indefinido e que, dentro do processo do filme dentro do filme, nos confunde.

Mas a piada pronta do título, que se alia a esse embaralhamento, é o que também serve de defesa para o filme. Afinal de contas, se o destino de cada ser é igual, e a tendência natural é fugir dele, a morte não deixa de ser um nada, sendo justamente o caminho que importa. Nesse percurso, o início do filme já deixa claro o que mostra e o que deixa de mostrar, o que é perceptível (o filme dentro do filme, o som do tiro) e o que vai (tentar) ser formado em nossa mente.

Pode-se criticar a construção de personagens, assim como um hipotético “excesso” de cinefilia de personagem-diretor via Hellman, e um grau de confusão que também remete a Lynch nos casos em que a força intuição sugerida supera a falta de compreensão didática – sendo Estrada Perdida (1997) e Cidade dos Sonhos (2001) os possíveis melhores exemplos. Hellman, contudo, parece querer mergulhar não na psicologia, ou nas agruras dos seus personagens, e sim nas do cinema.

“O que importa é o elenco”, “não estou com ciúmes, só me importo com que você faça o filme funcionar” e “largue a arma”, além de discussões com roteirista, são – com certa falha da memória para as aspas – alguns dos momentos textuais que ficam, mas que não impedem que Caminho para o Nada seja absurdamente visual. As duas formas do acidente, os diferentes takes feitos e refeitos, a recepção do filme (e como a câmera camufla situação em início e fim), assim como o último plano, trazem ao resultado final uma força que reside em obsessão pelo cinema. Com um lado apaixonadamente triste que, como toda arma, pode ser letal.

Ps: Uma pena filme ter passado apenas no 7º Festival Internacional de Cinema de Salvador que acabou no dia 24. Será que ele volta, Circuito Sala de Arte?

* Texto originalmente publicado no Pixelando Online.

3 comentários:

ANTONIO NAHUD disse...

Nunca vi nada do Hellman, um mito do cinema independente norte-americano.

O Falcão Maltês

ANTONIO NAHUD disse...

Leo, O Falcão Maltês entra de férias amanhã. Desejo um Feliz Natal e um ano de 2012 bastante proveitoso.

Até Janeiro!

O Falcão Maltês

Rafael Carvalho disse...

Rapaz, eu consegui a façanha de perder as duas exibições deste filme no Festival, e ainda teve o cancelamento da sessão dele no Panorama, lembra? Agora, é esperar o DVD.