quarta-feira, 16 de abril de 2008

Juno



Vitória da endorfina

Resisti à oferta de Divx's da vida e enfim vi no cinema (onde qualquer filme deve ser visto – pelo menos pela primeira vez) Juno (Juno, EUA/ Canadá, 2007), de Jason Reitman, essa coisa super-cultuada como filme-fofinho-original-independente-bem-escrito-e-dirigido. O resultado é realmente legal, tem seus momentos, mas no fundo e no fim não tem tanta originalidade quanto parecia (ou diziam) ter.

A história gira em torno de Juno (Ellen Page), que engravida de seu melhor amigo. A construção dessa relação, por mais irrelevante que pudesse ser, é fraca. Somente uma cena demonstra um grau de intimidade muito acima da média. Ainda assim, a relação entre “melhores amigos que transaram uma vez”, poderia ser simplesmente uma relação de “conhecidos que transaram uma vez”.

É estranho também alguém ser tão tímido, passar uma idéia quase assexuada – reconhecida pela própria família de Juno –, e ainda assim conseguir ser o melhor amigo de uma menina doidinha-punk-fã-de-cinema-gore. Esse alguém, aliás, é o tímido-nerd-assexuado-engraçado-bobão, que parece ter sido clonado de Superbad (2007) para cá. Michael Cera (aqui no personagem de Paulie Bleeker), bom nos dois papéis, corre o risco de virar o ator de espelho, com apenas pseudônimos para se interpretar – o que espero não acontecer, porque o garoto parece ter potencial. De qualquer jeito, ele funciona para dar aos outros personagens e ao público um caráter divertido, engraçadinho e constrangedor – bem-vindo quando o constrangido não é você.

Pensando nessas coisas, e em outros tantos momentos do filme, fico com a impressão de que Jason Reitman e nossa queridíssima Diablo Cody, a ex-stripper roteirista do filme, estavam muito mais preocupados em fazer um filme acessível a todo mundo e engraçado do que realmente em construírem personagens convincentes – mais bem vindos e necessários aqui do que em Superbad, por exemplo. Exceção feita a Juno, os outros são tratados na maioria das vezes com a profundidade de uma bandeja de garçom – e isso não me parece legal pela idéia do filme e do tratamento dado a Juno.

Outro momento que ilustra bem essa questão é quando Juno vai falar aos pais que está grávida. Sua melhor amiga está presente e dando pitacos (óbvia e previsivelmente engraçadinhos), e a reação dos pais é surreal, mas naturalmente divertida. A reação soa fake de uma maneira incoerente com a postura do tratamento dado a Juno. Outro ponto é o até interessante casal que aparece na história: Mark (Jason Bateman) quase tão bem construído como Juno, apesar de insosso demais, e Vanessa, que se mostra expressiva em uma aqui boa Jennifer Garner, mas que pouco faz além de funcionar como uma figura decorativa em um ou outro momento engraçado. Novamente, tem-se a impressão de que o “fazer rir” é 468 mais importante que um conteúdo.

Mas Juno, o filme, não é uma bomba e tem seus momentos e méritos pessoais. Primeiro, vale dizer que Juno, a personagem, não é explicitamente julgada nem tida como uma heroína. Ela é um adolescente de 16 anos que fez uma besteira, como gente mais velha e supostamente mais madura faz. E é mostrada assim. A atuação de Ellen Page também é ótima, e só não é perfeita porque ela oscila entre o real convincente (maior parte) e o caricato-engraçadinho.

Os defeitos do filme são parcialmente encobertos pelos pontos positivos, uns esperados e outros imprevisíveis em produções do gênero (?!). A incessante vontade de te fazer rir às vezes funciona, e o tema escolhido, bem como o tratamento dado à personagem principal, são válidos e fogem bem pouco da regra.

O que não foge, no entanto, é o fim, excessivamente fofinho, assim como as atitudes que levam a esse término, pouco convincentes – talvez se eu realmente tivesse 16 anos aceitasse aquilo, mas apenas talvez. Por outro lado, a cena final tem lá seu quê de original e marcante, mais até do que famigerada trilha que marca todo o filme, bonita e válida, mas que beira a irritação pelo exagero.

Terminada a sessão, fiquei com a impressão de que Diablo Cody (talvez talentosa mas aparentemente não genial) imaginava que não tinha como esse roteiro, com um diretor minimamente competente, não ser pelo menos sucesso de bilheteria entre os adolescentes. É no fundo uma coisa com um fundo sério que se perde e que serve pelo menos para se dar risada, o que universalmente faz bem, do cinéfilo mais ranzinza ao imbecil mais risonho. É pouco, pode não ser suficiente, mas até que funciona como um bom passatempo, que entretém mais do que ofende. Isso é válido.

Visto no cinema no dia 9 de abril

2 comentários:

Anônimo disse...

bom, na sua rígida distinção, eu estou definitivamente dentro dos "imbecis mais risonhos"...

no final das contas, Juno aparece como o filme certo na hora errada, pois eu creio sinceramente que muita gente pegou esse filme como bode expiatório em um momento pós Miss Sunshine, Pecados Íntimos etc. e eu acredito que a tal Diablo Cody tenha "tapeado" essa gente justamente porque se entregou de corpo e alma a um dos elementos mais solitários - seja em poder ou em ausência dele - dos filmes, isto é, os personagens...

na minha opinião, Juno carrega uma sinceridade monstruosa... é aquele filme sem-vergonha de ser o que é. gostei muito muito.

Leandro Afonso Guimarães disse...

acho que o problema maior de juno é que ele oscila demais. tem momentos que vc vê realmente alguém de carne, osso e sentimento ali, vc fica com a impressão de estar diante de um personagem transposto excepcionalmente para a tela - com direito a realismo e empatia válidas, o que é bem difícil. por outro lado, às vezes ela parece esquecer que isso é legal e estava ótimo (ou a construção veio depois, vai saber), e decide descambar para a o fazer rir - que funciona como tal, mas amolece o que os personagens (juno, bem mais que os outros) tinham de melhor. ainda assim, é válido ver um filme que transborda alguma honestidade. e, convenhamos, um interesse bem bom em ganhar um trocado - o que não faz mal a ninguém.

obs importante: eu ri muito no filme. dei menos gargalhadas do que em superbad - pra mim, ali sim uma coisa mais honesta, coerente e ciente de si -, mas isso não é demérito. juno's não fazem mal.